Carta de Couto de Vairão

D. Afonso Henriques

A 29 de Março de 1141, pouco antes da fundação da nação, D. Afonso Henriques concedeu ao Mosteiro de Vairão a carta de couto, pelo qual foi pago um valor de 300 morabitinos ao futuro primeiro rei de Portugal e 140 a Garcia Mendes de Sousa, seu alferes-mor, rico-homem das terras da Maia e com familiares enclausuradas no Mosteiro.

A carta de couto concedia, nesta época, poderes jurisdicionais quase ilimitados aos seus detentores, sendo inclusivamente proibida a entrada de oficiais régios na terra coutada. Apesar disso, não concedia o direito de propriedade, o que faz o rei D. Afonso Henriques incluir na carta a cedência dos lugares reguengos de Crasto (Vairão) e Azevedo (Fornelo).

Os privilégios dos coutos foram-se perdendo ao longo dos séculos seguintes, por motivo dos abusos gerados pelo excessivo poder administrativo e até judicial.

Apesar de ser difícil a interpretação correta das áreas englobadas no couto, devido à perda da maior parte dos topónimos e pontos de referência topográficos descritos no documento, como por exemplo as várias mamoas referidas, o couto do Mosteiro de Vairão deveria englobar um território correspondente à totalidade das atuais freguesias de Vairão, Macieira e Fornelo, incorporando também lugares de outras freguesias (ou recém-extintas freguesias), como Gião, Fajozes, Tougues, Canidelo, Guidões e Alvarelhos.

Transcrição de Rui Pinto de Azevedo, publicada pela Academia Portuguesa de História1:

In nomine Sanctae et Indiuiduae Trinitatis videlicet Patris et Filii et Spiritus Sancti amen, quorum indiuisa magestas et una deitas per infinita saeculorum saecula amen. Ego Alfonsus Portugalensium rex comitis Henrichi et reginae Tarasiae filius sub cauto pono et confirmo illud Monasterium de Vairam et omnes qui ibi habitauerint tibi abbatissae Eluirae Tuoreis pro remedio animae meae et parentum meorum et pro pretio quod a vobis accepi tercentos morabitinos. Et alferez meus qui et tunc ipsam terram de me tenebat Garcia Menendez CL.ª ut nunquam istud cautum rumpatur nec per potente terrae nec per sagionem nec pro calumnia aliqua sed semper sit inuiolatum per suos terminos. In primo loco ubi dicitur Olio Marino et inde per cabu da mamua de Ordiaes et vadit ad Angias Bellas et inde aa Regeira et vadit aa mouta de Ordiaes et in directum aa mouta codessina et fert in o Couelo et inde per aquam et fert ad Fontano Couo et vadit a agru de Sando et inde aa Pena et vadit aa Rutea de Quartas et inde vadit aa Cirquineira et inde per Iucebe et vadit aa estrada de Iucebe et inde per illum ribeiro de Mosteiru et intrat in Ave su o nasseiro de Iucebe et vadit per Ave a Faen super u nasseiru de Arnadu et inde a monte Maran et vadit per Valle de Freiru et fert untre Sancto Martino et Guidoes et inde su Murouzo Agudo et vadit aa mamua de Fauas et inde ad montem da Lagoa et inde per montem de Aspieira et vadit per cabu da mamua de Aspieira et intus est mamua et inde a Montezelo et vadit a Pumar et inde untre Nogueiras et Cacauellos et inde per fundum da deuesa et vadit untre Felgueira et a senra et inde a Peca Maa et inde per campu da Anca et fert a Fonte Fria et intus est fons et vadit aa Moreira et inde o Couelo et fert inde a archa et vadit pelu campo do forno et inde a Mamua Pedrosa et vadit aas pedras du Fear et inde a Mamua Coira et vadit au Parainni et inde a Manga ita quod reuertatur in Olio Marino. Et in ipso cauto ego Alfonsus rex pono in ipso cauto regalengum meum quantum ibi habeo intus scilicet in Azeuedo et in Castro. Si quis hos terminos inuaserit pro qualibet causa pariat ipsum cautum et quingentos solidos iudici sitque excommunicatus ac maledictus atque poenas luat in inferno cum Iuda traditore ac Simone Mago nec resurgat in die iudicii. Facta carta cauti IIII Kalendas Aprilis sub Era M.ª C.ª LXX.ª VIIII.ª. Ego Alfonsus rex hanc cartam propria manu roboro. Pro testibus: Petrus testis, Menendus testis, Pelagius ts. Haec carta data est per manum Heliae capellani et cancellarii. Egeas regius dapifer confirmo, Garcia Manendez alferez confirmo, Menendus Moniz confirmo, Gondisaluo Roderiguez confirmo, Fernandus Menendez confirmo, Laurentius Venegas confirmo. Nuno Denyz notarius scripsit.
PORTVGAL

Tradução resumida por Agostinho de Azevedo2:

“Em 1141, D. Afonso Henriques põe debaixo de couto e confirma o mosteiro de Vairão e todos os que aí morarem e à abadessa D. Elvira Turis, por remédio da sua alma e de seus pais, pelo preço de 300 maravedis para ele e 140 para o alferes Garcia Mendes, que tinha essa terra da sua mão.
Declara querer que esse couto nunca seja quebrado por nenhum poderoso da terra nem por nenhuma subtileza ou engano, ficando inviolável por seus termos, que cita e compreendem as freguesias de Vairão e Fornêlo e parte das de Guidões, Alvarelhos e Gião.
Termina dizendo que põe neste couto os reguengos de Azevedo e Castro, que tem dentro dele.
Termina pelas maldições e multas do costume contra os violadores do couto.”

  1. Academia Portuguesa de História – Documentos Medievais Portugueses: Documentos Régios – Vol.1 T.1 (1958)
  2. P.e Agostinho de AzevedoA Terra da Maia (1939) p.213
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